quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Desafios estratégicos das marcas – O desafio ele mesmo

Referi em artigos anteriores que existem vários desafios estratégicos em relação às marcas. Um deles é o desafio propriamente dito. O desafio ele mesmo. Se a marca é forte o principal desafio é manter-se no seu lugar e se possível melhorar. Se a marca é pequena já é suficientemente árduo manter-se viável, quanto mais destronar as marcas líderes do mercado. No entanto, é esta a tarefa que muitas marcas atribuem a si mesmas – e espantosamente algumas conseguem-no. Estas são as marcas desafiadoras. Mas vou colocar alguma ordem neste artigo, salientando alguns pontos:

(1) As marcas grandes têm tendência a ficar maiores
Os mercados contemporâneos estão dominados por um pequeno número de grandes empresas (grandes marcas) em cada sector. Exemplos: duas empresas (CocaCola e Pepsi) dominam o mercado mundial de refrigerantes.; uma empresa (Microsoft) tem quase um monopólio internacional dos sistemas operativos; cinco empresas controlam a maior parte dos recursos petrolíferos, etc. etc. Com o tempo, as quotas de mercado concentram-se num grupo de empresas cada vez menor, o que foi em parte conseguido através de um longo período de fusões e aquisições (nos media, nos automóveis, na indústria farmacêutica, etc.). Em muitas indústrias, a consolidação colocou mais poder nas mãos de poucos intervenientes no mercado. Estas empresas têm vantagens significativas, possuem grandes orçamentos de marketing e publicidade e conseguem em geral ganhar qualquer guerra de preços. Se isto falhar podem eliminar rivais, adquirindo-os.

(2) As marcas mais pequenas sofrem uma ameaça dupla
Como se isto fosse pouco para colocar as marcas mais pequenas em desvantagem, ainda existe o efeito de “ameaça dupla”. Foi Andrew Ehrenberg quem observou isto em primeiro lugar: uma marca pequena é punida duplamente por ser pequena, pois tem menos compradores e estes são menos leais.

(3) As marcas desafiadoras ganham mais dinheiro
Referi acima que existem marcas desafiadoras (que desafiam as líderes). É evidente que este tipo de marcas com sucesso podem garantir proveitos financeiros substanciais. Existem muitas provas de marcas desafiadoras que continuam a ganhar dinheiro. É claro que a maior parte dos lançamentos não são desafios. O Financial Times (Fonte: “The Business of Brands”, Jon Miller & David Muir, 2004) estudou 100 lançamentos e descobriu que 86% deles eram pequenos melhoramentos de produtos existentes. Também concluiu que as marcas que punham em causa as percepções dominantes sobre o mercado eram mais bem sucedidas; de todas as marcas do estudo, essas marcas desafiadoras geraram 38% da facturação e 61% do lucro. Aparentemente, parece que compensa colocar desafios. Mas desafiar o quê?

(4) Desafiar a definição do mercado
Responder às questões: “Quem são os nossos consumidores?” e “O que estamos a vender?” pode trazer vantagens competitivas enormes. Isto é especialmente verdadeiro para as marcas pequenas. Quando o motor de busca Google foi lançado, em 1998, o mercado de pesquisa de informações na Internet estava dominado pela Yahoo!, que na altura era uma empresa cotada na bolsa, com uma gestão forte e dezenas de sites web espalhados pelo mundo. A definição de mercado Yahoo! era algo como o que se segue: fornecer aos utilizadores da Internet um guia completo de sites, seleccionados pelos funcionários da empresa. O domínio da Yahoo! neste mercado parecia inatacável. Na verdade, tal era a influência sobre as actividades das pessoas na Internet que at´re nasceu uma campanha “a Yahoo! não presta”, pedindo às pessoas que boicotassem a empresa porque ela se tinha tornado excessivamente poderosa. Entretanto, neste cenário, a Google ofereceu uma nova perspectiva. Em vez de usar editores ou funcionários para avaliar a importância de um site, a Google varre a Internet e lista os resultados por ordem de popularidade. Este novo método permitiu à Google proclamar uma moral superior: a democrática. A linguagem da marca está cheia de expressões como “fácil, honesto e objectivo”, “natureza singularmente democrática” e “integridade”. Ora isto revelou-se muito sedutor para os utilizadores de Internet. Em meados dos anos 2000, a empresa procedia a 250 milhões de buscas por dia, ou 2900 por segundo, em 88 países e 32 línguas. Com isto a Google redefiniu o mercado, respondendo às questões “Quem são e o que querem os nossos consumidores? e “O que estamos a vender?”. Foi uma redefinição do mercado e, ao mesmo tempo, o lançamento de um novo modelo de negócio. A Google tornou-se uma grande empresa, mas partiu do zero.

(5) Desafiar a maioria
Em categorias estabelecidas, os consumidores costumam ter preferências relativamente fixas. Sabem do que gostam, sabem do que não gostam e não questionam muito as coisas. É esta a grande maioria (actua pela força do hábito, mas são milhões). O exemplo do Google acima indicado serve também para este caso. Mas vou citar outro exemplo. Quando a Interbrew lançou a cerveja Hoeggarden no Reino Unido, tinha uma resposta nova para a pergunta “Quem são os nossos clientes?”. A maioria das marcas de cerveja têm uma visão alargada, dirigindo-se a um conjunto vasto de consumidores. A Hoegaarden queria tornar-se na sólida preferência entre os consumidores jovens, endinheirados e “formadores de opinião”. Para atingir esse objectivo a cerveja foi fornecida unicamente a um pequeno número de bares da moda em Londres. Isto foi um modo eficiente de estimular a procura. À volta de Londres, os consumidores que aspiravam alcançar estatuto começaram a pedir esta bebida da moda, e no período de um ano muitos dos comerciantes que trabalhavam com a Interbrew insistiam em ter a cerveja no seu “stock”. Mas a Interbrew também colocou a pergunta: “O que estamos a vender?”. Na época do lançamento todas as cervejas no Reino Unido eram servidas em copos de cerveja uniformes e sem marca. Percebendo o valor das aparências entre os consumidores, muito conscientes da moda, a Interbrew introduziu um novo copo, com marca, para a Hoegaarden. Este formato foi rigorosamente aplicado: “equipas-mistério” de clientes Hoegaarden foram postas em campo e a qualquer bar que servisse a cerveja em copos simples seria rejeitada a distribuição. Isto resultou bem.

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